sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Poesia para lembrar a luta do negro


Poema de 


Me gritaram negra!

Tinha sete anos apenas,
apenas sete anos,
Como sete anos?!
Não chegava nem a cinco!

De repente umas vozes na rua
me gritaram negra!

Negra! Negra! Negra! Negra! Negra! Negra! Negra!

"Sou por acaso negra?" - me disse
SIM!
"O que é isso, ser negra?"
Negra!
Eu não conhecia a verdade triste que isso ocultava.
Negra!
E me senti negra,
Negra!
Como eles diziam
Negra!
E retrocedi
Negra!
Como eles queriam
Negra!
E odiei meus cabelos e meus grossos lábios
e olhei apequenada minha carne tostada
E retrocedi
Negra!
E retrocedi...
Negra! Negra! Negra! Negra!
Negra! Negra! Neeegra!
Negra! Negra! Negra! Negra!
Negra! Negra! Negra! Negra!

E passava o tempo,
e sempre amargurada
Continuava carregando às costas
minha carga pesarosa
E como pesava!

Alisei meu cabelo,
pus pó-de-arroz na cara,
e em minhas entranhas retumbava a mesma palavra
Negra! Negra! Negra! Negra!
Negra! Negra! Neeegra!

Até que um dia em que retrocedia, retrocedia e estava
           [ prestes a cair

Negra! Negra! Negra! Negra!
Negra! Negra! Negra! Negra!
Negra! Negra! Negra! Negra!
Negra! Negra! Negra!


E daí?
E daí?

Negra!
Sim
Negra!
Sou
Negra!
Negra
Negra!
Sou negra!

De hoje em diante não quero
alisar meu cabelo
Não quero
E vou rir daqueles
que para evitar - segundo eles -
que para evitarmos algum dissabor
Chamam os negros de gente de cor
E de que cor?!
NEGRO

E como soa lindo!
NEGRO
E olha esse ritmo!

NEGRO NEGRO NEGRO NEGRO
NEGRO NEGRO NEGRO NEGRO
NEGRO NEGRO NEGRO NEGRO
NEGRO NEGRO NEGRO

Por fim
Por fim compreendi
POR FIM
Ja não retrocedo
POR FIM
Avanço segura
POR FIM
E bendigo os céus porque quis Deus
que negro retinto fosse minha cor
E agora compreendi
POR FIM
Tenho a chave!

NEGRO NEGRO NEGRO NEGRO
NEGRO NEGRO NEGRO NEGRO
NEGRO NEGRO NEGRO NEGRO
NEGRO NEGRO
Negra sou!



(tradução de Ricardo Domeneck)






Victoria Santa Cruz é uma coreógrafa, dançarina, figurinista e poeta peruana, nascida em Lima em 1922. É irmã do poeta Nicomedes Santa Cruz. Estudou em Paris na Escola Superior de Estudos Coreográficos, onde criou os figurinos de peças como El retablo de don Cristóbal, de Federico García Lorca, e La rosa de papel, de Ramón del Valle Inclán. De volta ao Peru, fundou o Teatro y Danzas Negras del Perú. Apresentou-se e lecinou em diversos países, como Estados Unidos, Canadá, El Salvador, Guatemala, França, Bélgica, Suiça, Rússia e Israel, entre outros. Vive e trabalha, aos 91 anos, em Lima. Agradecemos a Marcus Fabiano Gonçalves por chamar nossa atenção para seu trabalho.

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